Estamos vivendo a maior crise humanitária e de saúde pública do último século, nunca fomos tão dependentes da ação da ciência. Sem ela não teríamos, a vacina mais rápida produzida na história, ultrapassando de longe sua antecessora no posto, a vacina de caxumba produzida em 4 anos. E muito menos conseguiriamos sequenciamentos do genoma viral em tempos recorde.
A mobilização massiva e ágil que colocou pesquisadores e cientistas na linha de frente para o enfrentamento da pandemia inquestionavelmente salvou milhares de vidas, mas por que, tal como importante, a ciência é questionada e desacreditada por diversos meios?
Essa sem dúvida é uma questão muito complexa que abrange vários níveis da nossa sociedade, desde os representantes federais, passando pela divulgação científica, até a forma como a ciência é mostrada aos estudantes do ensino básico. Logo trata não só apenas de uma questão circunstancial, como estrutural e por que não dizer cultural.
Cultural ou não, fato é que as dúvidas sobre as ações da ciência, e dos cientistas, só se agravam quando o líder, representativo, da nação se opõe publicamente a critérios, normas e estudos científicos, propagando de forma imprudente informações sem qualquer embasamento, ou embasadas somente em opiniões de uma minoria de pseudocientistas que põem a política a frente de sua profissão.
Porque sim, assim como em qualquer outra profissão, existem bons e maus cientistas; aqueles que se baseiam em estudos, provas, testes, argumentos e teorias e aqueles que fazem da convicção própria sua fonte. Mas não é de hoje que a ciência vem sendo sucateada em nosso país, a muito tempo o corte de verbas das agências de fomento e instituições públicas, que contribuem para o desenvolvimento de pesquisa científica, sufocam pesquisadores e universidades que ficam sem recursos quando não fecham as portas; com certeza quando isto ocorre durante uma pandemia a situação fica bem mais crítica.
Esses fatores deixam a ciência com aspecto secundário, e não tão importante frente a grande população, soma se a isso a enorme e consolidada rede de desinformação e fake news e está formado o princípio de desconfiança e descredenciamento, que faz com que seja muito mais fácil acreditar em uma mensagem de qualquer rede social do que em um especialista com anos e anos de carreira.
A informação ali próxima, na palma da mão, vinculada por um conhecido e que ainda condiz com todos os seus pensamentos, é mais atraente e acessível. Imbuído então dessa certeza, após ler um parágrafo sobre um assunto do qual era completamente leigo a 5 minutos atrás, é claro que essa pessoa repassará as novas e pior, discordará e enfrentará qualquer um que se oponha a sua mais recente opinião.
Porém a própria ciência não se isenta de culpa nessa situação, a dificuldade técnica e de linguagem empregada em seus artigos, ensaios e teses distanciam a população que é incapaz de compreender o que está sendo informado, é a ciência feita para própria ciência, sem o objetivo claro de atingir as pessoas de fora dos portões acadêmicos. Essa inacessibilidade e falta de informações sobre o que está sendo feito dentro dos laboratórios gera e aumenta as desconfianças.
É claro que isso também passa pelo modo como a ciência é ensinada, não adianta um texto científico mais claro possível sem que se conheça sequer os conceitos básicos apresentados. A ciência mostrada de forma desinteressante pode afastar o aluno desse mundo mágico e repleto de novas descobertas, levando a diminuição do senso crítico desses estudantes futuramente.
Contudo, mesmo passando brevemente por alguns pontos, podemos observar que o descredenciamento da ciência é algo multifatorial e sistemático, algo difícil de se resolver do dia para noite e sim através de diversos processos e cobranças, mas ainda há esperança.
Se por um lado a pandemia levantou dúvidas sobre a integridade da ciência, por outro esta área nunca esteve tão enfoque nas mídias, o que com certeza ajuda a despertar o interesse e instigar jovens a se tornarem futuros profissionais na área. Por fim percebemos nesses momentos que a frase de Carl Sagan se torna tão valiosa como clichê “Vivemos numa sociedade intensamente dependente da ciência e da tecnologia, em que quase ninguém sabe algo sobre ciência e tecnologia.”
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